No dia 6 de novembro o coordenador técnico do Instituto Curicaca, Alexandre Krob, apresentará uma palestra na semana acadêmica da ULBRA com o tema "Integração do conhecimento científico na gestão da biodiversidade feita por ONG: mais uma oportunidade para pesquisadores e alunos estarem protagonizando a conservação".
Essa temática tem sido recorrente em discussões científicas, como na palestra de abertura da XIII Jornada de Iniciação Científica Meio Ambiente, organizada pela FZB e FEPAM. No evento, Krob recompôs o histórico da ONG, destacando os momentos-chave em que a associação entre universidades e técnicos fundamentou estratégias para as ações de conservação.
Nosso trabalho
Embora não sejamos uma ONG criada no âmbito acadêmico, a aproximação com universidades ocorre desde nossos primeiros projetos. Ainda em Cambará do Sul, onde nasceu a ONG, foi desenvolvido o projeto de ecoturismo sustentável no entorno dos parques nacionais dos Aparados da Serra e Serra Geral, o qual contou com a participação dos professores da faculdade de agronomia que faziam pesquisa com plantas forrageiras e manejo da pecuária. As ações geradas a partir dessa associação resultaram nas pesquisas que difundiram para todo o estado o uso de bancos de proteína para preparar o gado para o melhor aproveitamento do campo nativo.
Expandimos nossa atuação para o litoral norte do estado, atuando no parque estadual de Itapeva, e nos aproximamos do Instituto de Biociências da UFRGS. Os alunos, em campo com o professor Andreas Kindel - um um forte pesquisador na área de conservação da biodiversidade no Rio Grande do Sul -, percebiam que apenas as abordagens acadêmicas sobre ações de preservação das espécies estavam distantes de ações efetivas. Com essa percepção, iniciamos um processo de associação entre as ações desenvolvidas por nós e o conhecimento em construção de alunos ativos e interessados. Kindel, foi fundamental para levar adiante esse processo - que ainda gera muitos frutos - e, também, para inúmeros projetos desenvolvidos por nós posteriormente. Além disso, essa parceria forneceu subsídios para que vários trabalhos acadêmicos, de teses de TCC a dissertações de Mestrados, fossem realizados a partir de nossos trabalhos, e vem gerando a qualificação profissional e científica de um grupo de biólogos que passa pelo Curicaca, primeiro como estagiários, depois com teses de mestrado ou doutorado.
Posteriormente, iniciamos o plano de conservação e uso sustentável dos butiazais no litoral norte, projeto que prosperou com uma forte integração de pesquisas e trabalhos acadêmicos. Esses estudos destacam aspectos da interação entre a comunidade e os butiazais, bem como as características dessa população de butiá catarinense, tais como a conservação e uso dos butiazais em ações de educação ambiental, relações entre dispersores e o fruto, as pressões sofridas pelos remanescentes e o declínio do ambiente butiazal na região. Graças a esses esforços, elaboramos uma normativa do manejo de folhas e frutos do butiá catarinense que hoje é referência em todo o estado - e, possivelmente, no país - para o regramento do uso sustentável, conduzida de maneira não burocrática, porém segura, dessa espécie. Outros trabalhos conduzidos no âmbito do projeto também levaram ao registro do modo de fazer artesanato com palha de butiá no em Torres como patrimônio cultural e imaterial do Rio Grande do Sul.
Essa interação de pesquisa e gestão foi transportada para os butiazais de Quaraí, nos butiazais do Coatepe, em um trabalho para o qual fomos convidados pela Fundação Luterana de Diaconia (FLD). Nesse projeto - cenário do TCC de Fabíola Barcellos, que realizou a análise da população -, pesquisadores (nossos e da ufrgs) têm gerado conhecimentos importantes para estratégias de compatibilização sustentável da pecuária com a conservação dos butiazais.
A coordenadora de educação ambiental e cultura do Instituto, Patrícia Bohrer, elaborou sua tese de mestrado a partir das ações de educação ambiental. Analisando o processo metodológico que utilizamos, Patrícia explicitou, através da sua dissertação, a estratégia de afeto, identificação e apropriação que utilizamos até hoje nos processos educativos.
“É preciso que haja uma aproximação entre a academia, que produz o conhecimento técnico e teórico, e instituições que atuam em ações diretas de projetos e políticas públicas.”
A provocação da palestra é mostrar que, além de possível, é necessária a integração entre ciência e ações práticas a fim de que ações de conservação gerem políticas públicas bem fundamentadas. “Quanto mais os estudantes, professores e pesquisadores puderem contribuir para esse tipo de integração, mais próximos eles estarão da realização efetiva de uma contribuição para a conservação” - diz Alexandre.
Obstáculos para a integração
Alexandre enfatiza os principais motivos pelos quais existe dificuldade de integração entre o conhecimento gerado nas universidades e sua aplicação em ações, projetos e políticas públicas.
Distância entre quem produz e quem usa o conhecimento
Os gestores ambientais, quando trabalham com licenciamento, regulamentação, formulação de políticas, criação e implementação de áreas protegidas, são os principais usuários desses conhecimentos. Entretanto, esses profissionais não costumam ter experiência contínua do uso das informações produzidas pela academia para suas tomadas de decisão. Assim, é preciso incentivar e dar suporte à aproximação com as universidades para que os gestores tenham o acesso a essas informações facilitado, viabilizando a aplicação de novas práticas e processos.
Acessibilidade dos dados
Os órgãos que dominam a produção de dados e de conhecimento muitas vezes não têm a preocupação em disponibilizar, ao público interessado em utilizá-los, um banco de dados acessível e transparente. Em alguns casos, os pesquisadores retêm as informações produzidas ou não conseguem dar visibilidade suficiente a essas informações. Um exemplo é o LIVE, sistema de dados em biodiversidade do estado construído pela FZB. Até hoje o site não tem uma interface amigável e intuitiva de acesso público que forneça, de forma organizada, dados de relevância para a sociedade.
Credibilidade
Muitos dados gerados no âmbito do licenciamento ambiental não são confiáveis. Há empresas de consultoria que copiam informações de processos de licenciamento de áreas completamente distintas. "Se gestor ou a sociedade quiser usar esses dados que, supostamente, são de qualidade, há o risco de que eles pertençam, na verdade, a outras áreas", diz Krob.
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