Rio Grande do Sul revive a trágica história do Bambi, que causou choradeira e aflição em muitas crianças da década de setenta. O Refúgio da Vida Silvestre Banhado dos Pachecos, onde habita a maioria dos últimos cervos-do-pantanal que ainda restam no estado, queimou durante os últimos três dias. O fogo, que surgiu no final do domingo em uma região de sítios e condomínios localizados na parte sul da Unidade de Conservação avança agora em direção às partes mais valiosas de banhado, que se encontram no coração do refúgio. É ali que nos últimos anos têm sido registrados machos, fêmeas e filhotes do maior cervídeo da América do Sul e que está quase extinto no território gaúcho.
O combate ao fogo, que desde segunda-feira vem sendo feito arduamente por funcionários da Secretaria Estadual de Meio Ambiente e, em seguida, recebeu ajuda de bombeiros e do comando ambiental, foi ficando cada vez mais difícil. Ao final da tarde de segunda-feira havia a expectativa de que uma chuva viesse para aliar-se e dar trégua à luta, mas na noite ela ficou em Porto Alegre e não chegou até lá. Na terça-feira pela manhã recebemos notícias do gestor de que não havia mais chamas, mas apenas fumaça, o que mudou completamente ao longo do dia e os riscos de um grave dano aos cervos aumentou muito. Agora há pouco a situação diminuiu quando o fogo, durante a noite, acabou se extinguindo em áreas mais úmidas.
O combate à incêndios em Unidades de Conservação exige bastante preparo. Equipes muito bem treinadas, com condicionamento físico para em meio à fumaça e ao calor conseguirem manter o trabalho e algumas cabeças com experiência de campo e formação técnica que possam definir a melhor tática para debelar o fogo ou para proteger a biodiversidade mais valiosa dentro da área protegida. Além disso, é preciso ter equipamentos adequados para o combate por terra e para a atuação aérea. A situação é diferente de incêndios urbanos e em edificações e a prática e as exigências são outras.
Na elaboração do Programa de conservação do cervo-do-pantanal no Rio Grande do Sul, coordenado pelo Instituto Curicaca em 2012, o risco de incêndio apareceu como uma grave ameaça e foram apontadas ações urgentes. Inclui a elaboração de um plano de combate a incêndios, a qualificação de guardas-parques, a constituição de um corpo de brigadistas e a aquisição de equipamentos. Infelizmente, o fogo veio antes que tudo pudesse ser feito e pode causar danos graves como em 2006, quando o Refúgio ardeu em chamas e o cervo teve que fugir da área. O ICMBio, por exemplo, tem um programa específico para tratar disso e as Unidades de Conservação tem equipes de brigadistas, algumas delas com técnicos especializados.
A ajuda que o Instituto Curicaca pôde dar, nesse momento, foi a de articular uma cooperação rápida para o combate ao fogo por parte da Estação Ecológica do Taim e da FLONA de Canela. Os reforços do ICMBio já estariam se deslocando, mas as boas notícias dessa manhã permitiu dispensá-los. A Sema também providenciou o combate com aviões tanque contratados. A sociedade precisa estar alerta e disponível para fazer a sua parte. Isso inclui estar pronto para ajudar quando preciso, tomar muito cuidado com o uso do fogo nas áreas privadas próximas aos parques e reservas e, também, torcer para que uma chuva venha ajudar a diminuir a tragédia.
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